Relatório Luz aponta retrocessos nos ODS e alerta para riscos de estagnação da Agenda 2030 no Brasil
O lançamento da 9ª edição do Relatório Luz da Sociedade Civil reuniu, nesta terça-feira (30), representantes do governo federal, da sociedade civil e de instituições internacionais em Brasília. O documento, elaborado por 46 organizações, como a Fiocruz, a União Europeia e a Plan International Brasil, apresenta um diagnóstico crítico sobre a implementação da Agenda 2030 no país e alerta para retrocessos em áreas centrais como combate à fome, violência, direitos humanos e meio ambiente.
A mesa de abertura foi marcada pela presença feminina. Participaram a secretária-executiva da Secretaria-Geral da Presidência, Kelli Mafort; a editora do relatório e cofundadora da Gestos, Alessandra Nilo; a senadora Teresa Leitão (PT-PE); a deputada federal Erika Kokay (PT-DF); a secretária nacional de Planejamento, Virginia de Angelis; o coordenador-geral de Desenvolvimento Sustentável, Vicente Araújo; e a assessora da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030 (EFA 2030), representando a Fiocruz, Zorilda Gomes de Araújo.
Entre os representantes internacionais, estiveram presentes nomes da ONU, PNUD, ONU Mulheres e UNAIDS.

Avanços insuficientes
De acordo com o relatório, apenas 12 das 169 metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) apresentaram avanço satisfatório no período de 2023 a 2024 — o equivalente a 7,14%. Outras 73 tiveram progresso insuficiente e 75 não avançaram, com casos de retrocesso em áreas como violência, desigualdade racial e preservação ambiental.
“O Brasil vive uma ‘encruzilhada paradoxal’, em que interesses privados e bloqueios políticos travam a implementação dos ODS”, afirmou Alessandra Nilo.
Desigualdade racial e de gênero
A publicação reforça o impacto da violência estrutural no país. A violência policial no Brasil mata três vezes mais que em 15 países do G20 juntos, e 82,7% das vítimas são pessoas negras. Outro dado grave é o aumento de 30% na mortalidade indígena por omissão estatal.
Segundo o UNAIDS, 64% dos novos casos de AIDS no Brasil afetam mulheres negras, que também recebem em média 47,5% menos que homens não negros. Para Ana Carolina Querino, da ONU Mulheres, “se nada for feito, vamos continuar reproduzindo as desigualdades e violências estruturais”.
Fome, pobreza e moradia
Apesar da recomposição de programas sociais como o Bolsa Família, que ajudaram a reduzir a população em extrema pobreza para 6,8% em 2024, o relatório aponta que o progresso no ODS 2 (Fome Zero) segue insuficiente.
A falta de moradia também preocupa: desde 2013, houve aumento de 25% da população em situação de rua, hoje somando mais de 327 mil pessoas, das quais 80% sobrevivem com até R$ 109 por mês.
Meio ambiente em alerta
No campo ambiental, os números também são críticos. O Pantanal perdeu 61% de sua superfície de água em relação à média histórica, e o Brasil registrou recorde de liberação de agrotóxicos em 2024: 663 novos registros em um ano. O relatório alerta que essas políticas ameaçam diretamente a saúde da população e a biodiversidade.
Credibilidade internacional
O coordenador do MRE, Vicente Araújo, destacou que o Brasil tem buscado protagonismo internacional com a defesa da justiça social e a preparação para a COP30 em Belém, mas ressaltou que “a credibilidade do país depende da coerência entre discurso e prática”.
A secretária do Planejamento, Virginia de Angelis, lembrou que o governo vem estruturando o planejamento plurianual até 2027 e a Estratégia Brasil 2050, em parceria com ministérios, estados e sociedade civil.
Vale ressaltar que no aspecto de estudos prospectivos, a Fiocruz, por meio da EFA 2030 e da Iniciativa Brasil Saúde Amanhã, está elaborando o projeto “A Saúde no Brasil em 2050”, que visa apresentar uma série de estudos e intervenções sobre o futuro da saúde no Brasil, entre estes a série “Brasil e Mundo no contexto da crise climática” em conformidade com a Agenda 2030.

Caminhos apontados
O Relatório Luz conclui que o Brasil precisa enfrentar questões estruturais para retomar os avanços: desbloquear recursos para políticas públicas, combater o racismo estrutural, reverter retrocessos ambientais e alinhar o financiamento público aos ODS.
“Construir para o Brasil uma nação desenvolvida e inovadora que cresce com justiça social e ambiental é o desafio que temos diante de nós”, disse Virginia de Angelis.
