Fiocruz integra esforços do governo no ODS 18, voltado ao combate ao racismo e à desigualdade étnico-racial

Por Carlos Gustavo Trindade – EFA 2030
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Brasília — Nesta sexta-feira (19), foi oficialmente assinada uma portaria interministerial que estabelece metas e indicadores para o ODS 18 — Igualdade Étnico-Racial, voltado ao combate ao racismo e à discriminação contra povos indígenas e afrodescendentes. O ato ocorreu no encerramento da 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Conapir), com participação da Secretaria-Geral da Presidência, do Ministério da Igualdade Racial e do Ministério dos Povos Indígenas, e reuniu cerca de 1.700 delegados após 7 anos de hiato.

A proposta de criação da ODS 18 partiu do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em discurso na 78ª Assembleia da ONU, em 2023, nos EUA. Ele esteve na abertura da Conapir, no dia 15.

O ministro-chefe da Secretaria-Geral, Márcio Macêdo, entregou o Caderno de Resposta da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), documento que lista as demandas quilombolas e detalha ações que 20 órgãos do governo federal já desenvolvem ou estão planejando.

Titulação de terras quilombolas ganha urgência

A Conaq reivindica que haja prazos concretos para regularização fundiária, reconhecimento, demarcação e titularidade das terras quilombolas, propondo um período de cinco anos para conclusão desses processos. A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, afirmou que embora o processo de titulação seja complexo — dividindo-se em nove etapas sob responsabilidade do Incra — há avanços, mas que será necessário “vontade política” em todos os níveis federativos para acelerar o trâmite.

O que dizem os especialistas

Para a socióloga Sueli Carneiro, referência em estudos sobre desigualdade racial, a institucionalização do ODS 18 “é um passo histórico, mas só será efetiva se for acompanhada de orçamento robusto e mecanismos de monitoramento com participação social real”. Ela avalia que, embora o governo tenha sinalizado avanços, o risco é que a iniciativa se limite a “ato simbólico sem impacto direto na vida das comunidades”.

Já o economista Daniel Cerqueira, pesquisador do Ipea, lembra que a definição de indicadores pode ser decisiva para medir resultados. “O Brasil tem histórico de criar políticas públicas sem sistemas consistentes de avaliação. O ODS 18 pode corrigir isso, desde que haja transparência e dados confiáveis.”

Para analistas de relações internacionais, o ODS 18 também projeta o Brasil como ator global na agenda de direitos humanos. “O país passa a ocupar um espaço estratégico no debate internacional ao pautar o racismo como questão de desenvolvimento sustentável”, explicou Carlos Milani, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ.

Monitoramento, pesquisa e participação

Além da portaria, foi anunciado investimento de R$ 1 milhão para projetos de pesquisa que fortaleçam o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade (Sinapir). Também foi entregue o caderno de respostas Conaq, e Macêdo enfatizou que a comunidade quilombola deve acompanhar a execução das políticas, cobrar resultados e monitorar o cumprimento das determinações presidenciais relativas à igualdade racial.

Indicadores e estrutura

O ODS 18 já conta com metas e indicadores definidos: são 10 metas principais, 65 indicadores principais e 68 adicionais, elaborados de forma participativa, com contribuições de órgãos como IBGE, IPEA e Fiocruz, além da sociedade civil. A validação desses indicadores foi feita pela Câmara Temática ODS 18, vinculada à Comissão Nacional para os ODS (CNODS), órgão que reúne entidades do governo e da sociedade civil e da qual a Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030 (EFA 2030) compõe o corpo de assessoria técnica.

O que ainda está em jogo

Especialistas e representantes das comunidades lembram que a assinatura da portaria é apenas o começo de uma agenda que terá de enfrentar entraves históricos e burocráticos. O desafio da titulação de terras quilombolas, por exemplo, é emblemático: há comunidades que esperam décadas por esse reconhecimento legal.

Além disso, para se tornar efetiva, a nova política dependerá de:

  • alocação orçamentária suficiente para implementar as metas;
  • articulação federativa entre União, estados e municípios;
  • mecanismos de transparência e participação que permitam avaliação pública dos avanços;
  • continuidade institucional, para que mudanças não se limitem a atos simbólicos.